McLaren MP4-12C une charme, desempenho e preço para rivalizar com
superesportivos tradicionais
Como uma boa marca
inglesa, a McLaren andou no sentido inverso. As grandes fabricantes de
superesportivos começaram produzindo modelos de rua com alto desempenho e foram
para as pistas em busca da confirmação da sua capacidade esportiva. Já a McLaren
nasceu nas pistas e somente em 1992, quando já enfileirava nove de seus 12
títulos na Fórmula 1, decidiu se apoiar no prestígio das corridas para criar um
carro de rua. Os 20 anos de experiência da empresa de Ron Dennis no mercado
embarcaram no atual MP4-12C, um bólido capaz de ir de zero a 100 km/h em 3,3
segundos e atingir a velocidade máxima de 330 km/h. Isso no modelo 2012. Na
versão 2013, o modelo recebeu um novo mapeamento na central eletrônica que
elevou a potência dos atuais 600 cv para 625 cv. Com isso, a máxima passa a ser
de 333 km/h e o zero a 100 é feito em 3,2 segundos.
Mesmo com números tão
acachapantes, o MP4-12C é o modelo mais “realista” já produzido pela McLaren.
Por mais irônico que possa parecer para um automóvel de US$ 300 mil, a proposta
foi melhorar o custo/benefício. De fato, ele tem uma função mercadológica bem
definida: brigar no ínfimo mercado que congrega modelos de marcas como Ferrari,
Lamborghini, Aston Martin e Maserati, entre outras. O primeiro McLaren de rua
saído das linhas de Woking, na Inglaterra, em 1992, que era pouco menos que um
Fórmula 1 amansado e equipado com itens obrigatórios, como faróis, lanternas e
piscas – até chamava-se McLaren F1. Era o carro mais caro do mundo e custava na
época US$ 1,25 milhão – em valores atuais, cerca de US$ 2 milhões – pouco mais
de R$ 4 milhões. Não é à toa que ao longo de sete anos de vida, entre 1992 e
1998, foram produzidas apenas 106 unidades.
O MP4-12C tem um preço
bem mais equalizado com o mercado. Os US$ 300 mil – algo como R$ 600 mil –
pedidos pelo modelo inglês significam exatamente o mesmo valor inicial da
Ferrari 458 Itália, modelo-alvo principal do McLaren. No Brasil, em uma
importação direta, a MP4-12C sai por R$ 1,5 milhão. Caso da unidade avaliada,
trazida através da empresa Connect. Já a Ferrari 458, trazida pela importadora
oficial Via Itália, custa acima de R$ 1,8 milhão.
Para se equiparar em
preço a outros superesportivos de primeira linha do mercado, a McLaren buscou
injetar maior racionalidade no projeto. A marca vinha de uma associação com a
Mercedes-Benz, com quem produziu o SLR McLaren entre 2003 e 2010. Na época, o
trabalho da fábrica inglesa ficava concentrado na parte de engenharia e deixava
para a marca alemã o duríssimo trabalho de vender o modelo. O foco era a Ferrari
599 GTB Fiorano, que custava lá fora US$ 600 mil e ficava no topo da linha
italiana. A expectativa era emplacar 500 unidades por ano, mas a média ficou bem
abaixo disso. Não chegou a 280 vendas anuais. No total dos oito anos de vida
foram vendidas 2.200 unidades no mundo, 10 delas no Brasil.
Em cada
pormenor, a MP4-12C segue lógica geral para um superesportivo desse quilate. As
linhas obedecem aos princípios aerodinâmicos básicos de um bólido que ultrapassa
os 300 km/h: frente em cunha, habitáculo em arco e traseira com caimento suave e
corte abrupto, típico de um cupê. A descarga do motor foi elevada à linha das
lanternas, na metade da altura da traseira, para permitir a adoção de um
extrator bastante avantajado. As portas abrem para cima – são do tipo tesoura.
Para ficarem leves, pois têm apenas um ponto de fixação na carroceria, foram
feitas em fibra de vidro. Em busca de “emagrecer” o carro, carroceria foi
composta de diversos materiais. Capô, para-lamas e teto são em alumínio,
enquanto os para-lamas traseiros e saias, como as portas, são em fibra de
carbono. E os elementos aerodinâmicos, como spoiler, extrator e aerofólio são em
fibra de carbono.
A ideia da McLaren com
esse novo modelo foi melhorar a performance comercial. Para isso, a montadora
inglesa projetou um carro destinado à base do segmento dos superesportivos. E
para conter custos, passou a utilizar de componentes já desenvolvidos por outras
empresas e se concentrou na reengenharia. Os números de desempenho provam, no
entanto, que esta mudança de foco não esmoreceu o espírito da marca.
O
propulsor foi desenvolvido pela preparadora britânica Ricardo e tem como base o
bloco do Q45 V8, na Nissan. Este motor foi utilizado nas pistas pela Infiniti,
em Le Mans entre 1997 e 1999, e depois na Fórmula Indy pela própria Nissan, até
2005. Ele é um V8 a 90º twin-turbo, com turbinas de alta pressão – 1,2 bar –,
produzidas pela Mitsubishi. O bloco é forjado em alumínio e tem a parte interna
dos cilindros recoberta com Nikasil – uma cerâmica à base da liga de níquel com
carbeto de silício – mais resistente que o cromo, normalmente usado. O duplo
comando no cabeçote é variável e a injeção de combustível é direta. Tampa do
cabeçote e coletores de admissão são em plástico de alta
resistência.
Além disso, tirou proveito da queda acentuada nos custos de
materiais de alta tecnologia, como fibra de carbono. Um bom exemplo é a chamada
célula de sobrevivência, composta por uma peça única – ela é uma plataforma com
abas em torno. É ela que forma a estrutura central do carro. As travessas que
sustentam o motor e as suspensões são afixadas nas extremidades, enquanto a
parte central serve como piso do habitáculo. Há 20 anos, uma célula como essa
saía a US$ 100 mil para produzir. Hoje custa US$ 10 mil.
A estrutura de
fibra de carbono é moldada com todos os encaixes em alumínio para instalação dos
suportes do bloco, das suspensões e dos reforços para casos de colisão. Na
unidade em questão, havia opcionais de acabamentos em fibra de carbono no
interior e em torno do propulsor e também recebeu freios especiais em
fibra-cerâmica, mais eficientes que os normais, em aço. A suspensão tem rigidez
variável e foi baseada em um sistema desenvolvido pela Citroën para seus bólidos
no mundial de rali, o WRC – e logo proibido pela FIA, tal a vantagem competitiva
que ofereceu ao octacampeão Sébastien Loeb.
O sistema substitui os
amortecedores por largos cilindros. No interior, pistões que se movimentam de
acordo com o ajuste de rigidez indicado por uma central eletrônica. O conjunto é
conectado a acumuladores e alteram a rigidez através de uma bomba hidráulica
externa. Quanto maior a pressão, mais rígido fica a suspensão. A arquitetura
geral é de braços oscilantes na frente e multilink na traseira, com molas. Como
sempre, para aliviar o peso do modelo, todas as peças em alumínio forjado. No
total, os 600 cv da MP4-12C tem de empurrar 1.336 kg. Ou seja: cada cv se
encarrega de apenas 2,25 kg.
Caminho
próprio
Se fosse trazida por vias normais, o preço do McLaren
MP4-12C pularia dos R$ 1,5 milhão que custou para quase US$ 2 milhões. Mas esse
“desconto” não é resultado de nenhuma esperteza tributária. O fato é que a
Connect Motors achou uma trilha paralela para assegurar um preço mais
interessante para os carros que traz. Em vez de agir como importadora, a empresa
apenas intermedeia a aquisição do carro. Quem compra mesmo é o cliente, pessoa
física. E por isso mesmo, várias obrigações que uma importadora sofre são
evitadas.
E
isso simplifica a vida tanto da Connect, que intermediou, quanto do comprador.
Como a compra é feita diretamente pelo interessado, a empresa não tem de arcar
com custos de garantia e fornecimento de peças, como ocorre com qualquer
importadora. Por outro lado, o comprador pode conseguir na Justiça o não
pagamento ou a reversão do Imposto sobre Produtos Industrializados, o IPI, já
que a compra não visa lucro – a princípio, a intenção não é revender o bem. No
caso da McLaren, o IPI chegou a R$ 350 mil. Caso ele seja revertido, o carro
sairá por 1,15 milhão.
Todo o trabalho
é feito pela Connect. O cliente escolhe o modelo e determina as características
que quer. A empresa então rastreia mundo afora até encontrar o exemplar de
pronta entrega que mais se aproxima. O McLaren em questão, por exemplo, foi
encontrado na Itália. A partir daí, toda a burocracia é tratada pela Connect em
nome do cliente e o carro chega às mãos dele, em média, em 30 dias,
completamente desembaraçado. No caso de marcas sem representação oficial no
Brasil, como a McLaren, a encomenda até pode ser feita diretamente na fábrica.
Desse jeito, o cliente pode escolher cada item do carro. Só que isso nem sempre
garante preços mais baixos – um revendedor muitas vezes tem maior poder de
barganha do que alguém em uma venda isolada. E o tempo de espera é sempre maior
– pelo menos, dois meses –, pois o carro só começará a ser feito depois do
acerto com a fábrica.
Um trabalho parecido pode ser feito em relação a
modelos antigos. Como a lei permite que automóveis com mais de 30 anos de
fabricação sejam trazidos como peça de coleção, a mesma intermediação pode ser
organizada pela empresa. Nesse caso, é preciso que o interessado faça parte de
algum clube oficial de antigomobilismo, encontre o modelo que deseja e acerte a
compra com o proprietário. A partir daí, os trâmites seguem o mesmo processo que
é feito para modelos zero-quilômetro.
Primeiras impressões
Arte hi-tech
Itu/São Paulo –
O MP4-12C é um animal tecnológico. E não deixa nenhuma sombra de dúvida já no
primeiro contato. A carroceria baixíssima tem desenho fluido, as bitolas são
exageradamente largas, valorizadas pelos para-lamas traseiros ressaltados e
ainda traz rodas grandes e vazadas, que deixam à mostra o hiperbólico freio de
carbono-cerâmica. Foi pensado e esculpido como uma obra de arte. Para não
estragar a embalagem, a McLaren resolveu não instalar maçanetas nas portas. O
trinco é acionado por um sensor de movimento embutido sob o vinco na linha de
cintura. Ao se passar a mão por ali, a porta se destrava e o vão entre a porta e
a carroceria é suficiente para se puxar a porta com a ponta dos dedos – e ela se
eleva com extrema leveza.
Entrar no habitáculo não é uma tarefa fácil. A
contorção exige um pouco de flexibilidade. Mais importante, no entanto, é a
agilidade, para fazer um movimento muito rápido. Já que não é possível fazer a
manobra com elegância, que as testemunhas tenham menos tempo para observar. Para
passar pelo pequeno vão e alcançar o banco é preciso virar de costas, se curvar
para a frente e recuar. Nada charmoso. O corpo deve ficar encaixado no banco. O
banco mistura regulagens elétricas e manuais para ajustar, inclusive, as abas
laterais e o apoio lombar. Mas uma vez instalado no cockpit – na verdade, é
quase com vestir o carro –, o poder de atração do cidadão aumenta
exponencialmente.
Por dentro, o revestimento é todo em couro e Alcantara,
uma espécie de camurça especial para automóveis. Há detalhes em alumínio nos
instrumentos com apliques de fibra de carbono. Tudo é bem caprichado. O volante,
de base reta, é recoberto em couro e alcântara. Em torno do volante estão os
comandos para uso sequencial da marcha, das setas, do limpador e do cruise
control. No console entre os bancos, fica o comando do câmbio, acionado por três
botões: ré, neutro e drive. As passagens manuais são comandadas apenas pelas
palhetas no volante. Ali estão também a mini-avalanca do freio de estacionamento
e os botões do pisca-alerta, do controle manual do aerofólio e da trava das
portas.
Logo acima, no console
central, há mais quatro botões e ficam dois controles giratórios, parecidos com
os que têm nos volantes de Fórmula 1. Acima, a principal interface com tanta
eletrônica: uma tela de sete polegadas colocada verticalmente. Mas para
configurar todas as possibilidades de acertar o McLaren, é preciso estudar
detidamente o manual. Com todos estes comandos, pode-se definir com que humor o
MP4-12C vai agir, como o comportamento do câmbio e a rigidez da suspensão.
O ronco do V8 de 593 cv ajuda na fama de mau do McLaren. Do lado de
fora, o barulho assusta . De dentro da cabine, instiga. O excesso de botões
tende a criar uma relação com o carro um tanto fria, mas a direção, extremamente
direta, devolve um pouco a humanidade. O manejo é tão prazeroso que logo o carro
parece uma extensão do piloto. A suspensão é absolutamente neutra nas curvas.
Mesmo numa sucessão delas, não há rolling. Por outro lado, transfere para o
motorista o pequeno tremelique provocado por uma fissura no
asfalto.
Mesmo em modo automático, as marchas se sucedem rapidamente. Em
poucos metros e sob uma pressão discreta no acelerador, o velocímetro avança
vertiginosamente. Com uma pressão um pouco maior no pedal, o corpo é comprimido
contra o banco. Isso impressiona, como impressionaria em qualquer modelo com a
relação peso/potência de 2,25 kg/cv. O inusitado nesta McLaren é a capacidade de
parar. Os discos em carbono-cerâmica parecem dispostos a estancar o carro ao
mais discreto toque no freio. Para um carro que acelera tanto, a urgência de
parar pode ser tanta que até o aerofólio entra no mutirão com os freios da
Brembo. Numa freada muito forte, ele se inclina a 69º, para aumentar o arrasto
aerodinâmico.
Ficha técnica
McLaren MP4-12C
Motor: A
gasolina, central-traseiro, longitudinal, 3.799 cm³, biturbo, oito cilindros em
“V”, com quatro válvulas por cilindro, duplo comando no cabeçote, duplo comando
variável de válvulas. Injeção direta e acelerador eletrônico.
Transmissão: Câmbio automatizado de dupla embreagem com sete marchas
à frente e uma a ré. Tração traseira. Oferece controle eletrônico de
tração.
Potência máxima: 600 cv a 7 mil rpm.
Torque máximo:
61,1 kgfm entre 3 mil e 7 mil rpm.
Aceleração 0-100 km/h: 3,3
segundos.
Velocidade máxima: 330 km/h.
Diâmetro e curso: 93,0 mm x
69,9 mm. Taxa de compressão: 8.7:1.
Suspensão: Dianteira e traseira
independentes e eletrônicas com controle de chassi ativo. Oferece controle
eletrônico de estabilidade.
Pneus: 235/32 R19 na frente e 305/30 R20
atrás.
Freios: Discos ventilados na frente e atrás. Oferece ABS.
Carroceria: Cupê em monobloco de fibra de carbono duas portas e dois
lugares. Com 4,50 metros de comprimento, 1,90 m de largura, 1,19 m de altura e
2,67 m de distância entre-eixos. Oferece airbags frontais, laterais e de
cortina.
Peso: 1.434 kg.
Produção: Woking,
Inglaterra.
Lançamento: 2010.
Por: Eduardo Rocha /
Auto Press